31 de janeiro de 2018

quase

o sol
e o vento
e o café
e o cigarro

e o caminho
o calçado
a fome

o acalanto
a saudade
o desespero

e o vazio
o exagero
o calor
a febre

a música
os dias
a escolha
a água

e o medo
a planta
o objeto
a sede

o desconexo
a coragem
o cobertor
o pôr-do-sol
o silêncio

e a pele
a distância
o papel
o cheiro

e a cidade
o instrumento
o beijo
 a fé

nada basta.


 

circunfluência

na última noite em que nos vimos
sentamos, os dois, na beira da calçada suja e encostamos os pés na areia
sentimos o vento salgado entrar na boca
e areias se prenderem nos pequenos espaços entre os dentes
mastigamo-nas

o barulho dos carros e as televisões e as vozes
se misturando com o som irregular das ondas
ecoavam por nossos ouvidos dançando de um lado para o outro
nada fica

na última noite em que nos vimos
andamos de mãos dadas chutando pedras soltas
algumas presas nos pequenos espaços entre os dedos do pé
tiramo-nas

o céu escurecido, a lua oscilante entre as nuvens
 o clarão dos postes quentes e amarelos sobre nossas cabeças
iluminavam o caminho que fazíamos sem saber pra onde
nada segue

na última noite em que nos vimos
sentamo-nos frente a frente
olho a olho
toque a toque
teu pêlo fazendo cócecas na minha pele

o silêncio arruinava nossa poesia
a desmedida despedida
a saudade já presente
a ausência já saudosa
o silêncio arruinava nossa esperança
fechamos os olhos
o céu, a lua, as vozes, o mar, os carros, as nuvens, as televisões,
nada é

na última noite em que nos vimos
fechei os olhos pra não te ver partir
e tu foste
porque nada segue
nada fica
nada é